A Necessidade de Revisão do Fluxo de Valor no Lean: Um Olhar Crítico sobre a Emergência e a Percepção de Valor
Introdução
A concepção de fluxo de valor é fundamental no paradigma Lean, fundamentando-se na perspectiva de que valor é algo inerente que pode ser identificado, mapeado e fluir de um estágio de processo para o seguinte, visando máxima eficiência e eliminação de desperdícios. Entretanto, a proposição deste artigo reside na argumentação crítica de que o valor não é uma entidade inerente e transportável, mas uma propriedade emergente que surge da interação entre elementos em um sistema.
Valor: Uma Propriedade Emergente e Não Transportável
Para contemplar a ideia de que o valor é emergente e provém da interação entre elementos, é essencial primeiramente desconstruir a noção clássica de que valor é um atributo identificável e transportável. Esta concepção tradicional sugere que, uma vez identificado, o valor pode ser mapeado e a sua trajetória ao longo do processo pode ser otimizada para reduzir desperdícios e maximizar a eficiência.
Contudo, ao considerar o valor como uma propriedade emergente, percebemos que ele não é um atributo constante ou universal, mas algo que surge das interações complexas entre diferentes elementos de um sistema. Esta visão reformula a ideia de um fluxo de valor linear e passível de otimização através da mera remoção de obstáculos ou ineficiências ao longo de um caminho predefinido.
A Emergência do Valor: Uma Visão Sistêmica
Sob a ótica sistêmica, o valor emerge das relações e interações entre as partes, sendo co-criado e percebido de maneira diversa pelos stakeholders envolvidos. Uma experiência positiva para o cliente, por exemplo, não emerge simplesmente movendo um produto ou serviço linearmente através de uma série de estágios, mas é cocriada através da interação entre várias dimensões, incluindo a qualidade do produto, a interação com os membros da equipe, a percepção de marca e outras variáveis.
Em uma aplicação prática, considere um serviço de hospitalidade em um hotel. O valor para o hóspede não é transportado linearmente desde a reserva até o check-out. Ao contrário, é emergente e cocriado através da interação entre vários elementos, como a amabilidade da equipe, a qualidade das instalações e a atmosfera do local. Cada interação tem o potencial de criar ou destruir valor, dependendo da percepção do hóspede.
Desafios e Oportunidades na Revisão do Fluxo de Valor
Ao considerarmos o valor como emergente, devemos reconhecer que sua criação não é garantida e que o mapeamento de fluxo de valor precisa ser revisto para refletir a complexidade e a natureza multifacetada dessa criação de valor. O novo paradigma exigiria uma abordagem que considere a interconectividade dos elementos do sistema e como eles coletivamente contribuem para a emergência do valor.
Isto desloca o foco de uma visão processual e linear para uma abordagem mais holística e sistêmica, que reconhece a rede de interações e o ambiente propício onde o valor tem a possibilidade de emergir. Implica também na aceitação de que o valor nem sempre emerge e que fatores, muitas vezes intangíveis e complexos, influenciam a sua cocriação.
Conclusão
O desafio e a oportunidade residem na reconceptualização do fluxo de valor no contexto Lean, de maneira a considerar o valor não como um atributo inerente e transportável, mas como uma propriedade emergente, oriunda da complexa rede de interações entre os elementos de um sistema. Esta revisão convida os praticantes do Lean a explorar novas estratégias e ferramentas que são sensíveis à complexidade e à natureza cocriativa do valor, abrindo um novo capítulo na evolução da filosofia Lean que é adaptativa, resiliente e autenticamente centrada no cliente.
Artigo escrito por Ricardo Martins, Professor no Mestrado em Design de Serviço, Savannah College of Art and Design – EUA ralexm@gmail.com
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